No primeiro fim de semana deste mês, no embalo do
assassinato de George Floyd por policiais, chegou ao auge no jornalismo
americano um processo que vem fervilhando há anos e que se origina da mescla da
reação da opinião pública contra o racismo, a intolerância e os ataques de
Donald Trump à imprensa, o combate à violência policial, o crescimento das
redes sociais e o advento de uma nova geração de jornalistas, muitos deles
negros.
O New York Times publicou no domingo
e novamente na segunda-feira passados o artigo a seguir, que sugere o possível
surgimento de um novo paradigma na imprensa dos Estados Unidos – com possíveis
reflexos no resto do mundo democrático – que, devido a sua importância, eu
decidi traduzir e publicar, para conhecimento do público e especialmente dos
jornalistas brasileiros.
Seu autor é o colunista de media Ben
Smith, que começou a trabalhar no New York Times em 2020, após oito anos como
fundador e editor-chefe do BuzzFeedNews. Antes disso, atuou na cobertura de
política para o Politico, The New York Daily News, The New York Observer e The
New York Sun.
A EQUAÇÃO DA MIDIA
Por Dentro das Revoltas que Irrompem nas Grandes
Redações dos Estados Unidos
Reivindicações de membros da equipe
ajudaram a encerrar o mandato de James Bennet como editor de Opinião do New
York Times. E estão causando tensão no The Washington Post. Parte da história
começa em Ferguson, no Missouri.
Publicado em
7/6/2020 e atualizado em 8/6/2020
Wesley
Lowery acordou em Ferguson, no Missouri, dia 14 de Agosto de 2014, seu rosto
ferido por um policial que o havia golpeado contra uma máquina de venda de
produtos. Além disso ele tentava recolocar seus cadarços nos sapatos, depois
que a policia os retirou ao atirá-lo numa cela na noite anterior. Por volta das
08:30 da manhã, ele ligou para o
programa matutino da CNN, onde o apresentador lhe transmitiu um conselho de Joe
Scarborough, da MSNBC: “Na próxima vez que um policial te mandar circular
porque há manifestações por perto, bem, você provavelmente deve obedecer.”
Lowery,
furioso, respondeu: “Eu gostaria de convidar Joe Scarborough para vir a
Ferguson e sair do Starbucks onde ele está tomando arrogantemente seu café”,
disse ele à CNN, narrando que “jogaram gás lacrimogêneo em mim, me atingiram com balas
de borracha, eu vi mães, filhas, chorando, um garoto de 19 anos em
prantos enquanto corria para tirar sua irmã de 21 anos de uma nuvem de gás
lacrimogêneo.”
O desabafo
de um repórter de 24 anos do Washington Post provocou olhares espantados em
Washington. Mas Lowery seguiu em frente e fez seu nome em Ferguson como uma
estrela agressiva e conhecida, formulando uma nova e crua perspectiva sobre a
injustiça racial. Seis anos mais tarde, pouca gente na indústria da notícia põe
em dúvida a premissa de Lowery: a polícia americana é mais brutal e desonesta
do que grande parte da mídia reportava, antes do episódio de Ferguson.
“Eu vejo
tudo de maneira diferente e nunca faria aquilo de novo,” disse-me Scarborough
sobre as palavras que trocou com Lowery em 2014. “Eu devia ter calado a boca.”
Momentos
históricos não têm começo e fim de forma bem definida, mas a nova maneira de
cobrir os protestos sobre direitos civis, como o próprio movimento “Vidas
Negras Importam”, se desenhou nas ruas de Ferguson. Testemunhar de perto a
brutalidade de uma estrutura de poder branca, para com seus cidadãos negros e
pobres, ajudou a criar a forma pela qual
uma geração de repórteres, em sua
maioria negros, passaram a enxergar seu trabalho, quando voltaram para suas Redações.
E em 2014
eles passaram a ter no Twitter um poderoso veiculo. A plataforma oferecia um
contrapeso a suas Redações, que durante anos procuravam contratar repórteres
negros, com a condição implícita de que eles mordessem a língua sobre o
racismo.
Agora,
quando os Estados Unidos encaram a eclosão de um movimento que começou em
Agosto de 2014, suas maiores Redações tentam harmonizar uma tradição que visa a
convencer a maior audiência possível de que suas reportagens são neutras, com
jornalistas que acreditam que, em questões que vão de raça a Donald Trump, uma
cobertura correta exige claras decisões morais.
O conflito
explodiu recentemente em protestos públicos no The New York Times, culminando
na demissão de seu editor-chefe de Opinião, no último domingo; no The
Philadelphia Inquirer, cujo editor executivo pediu demissão no sábado, por
causa da manchete “Prédios Também Importam”; e no Pittsburgh Post-Gazette. E
tem sido motivo de uma silenciosa agonia no The Washington Post, que Lowery
deixou no começo deste ano, meses depois que o editor executivo, Martin Baron,
ameaçou demití-lo por externar suas opiniões no Twitter a respeito de raça,
jornalismo e outros assuntos.
A opinião de
Lowery de que “o valor fundamental das organizações noticiosas tem de ser a
verdade, não a percepção de objetividade”, como ele me disse, tem ganho uma
serie de batalhas, varias delas sobre como cobrir questões de raça. Acaloradas
críticas pelo Twitter ajudaram a eliminar eufemismos como “racialmente saturado”.
De maneira gradual e desajeitada, os grandes veículos cederam terreno, usando
mais livremente “racista” e “mentira”, especialmente ao descrever o
comportamento de Trump. O Times prometeu reorganizar sua seção de Opinião
depois que um artigo do senador Tom Cotton, advogando o uso de tropas militares
em cidades americanas, enfureceu a Redação na semana passada.
Eles
Levantaram as Mãos
O grupo de
repórteres que desembarcou em Ferguson
quando um rapaz negro de 18 anos, Michael Brown Jr., foi mortalmente alvejado
por um policial branco, era mais negro que a maioria das grandes Redações
americanas. Isso não ocorreu por acidente – muitos repórteres haviam levantado
as mãos para cobrir uma pauta que apareceu primeiramente no Twitter . Lowery,
novo setorista do Congresso, perguntou se poderia ajudar no blog ao vivo do The
Post, comentando o que aconteceu depois do tiro, mas em vez disso viu-se a andar pelas ruas. Yamiche Alcindor, então com 27 anos, viu a noticia no Twitter,
“achou que o USA Today deveria cobrir aquilo no próprio local” e pediu para ir.
Akilah Johnson, então com 35 anos, repórter do Boston Globe, enviou em e-mail a
seu editor dizendo que “uma cidade americana está em chamas” e foi posto num
avião. Craig Melvin, 35 anos, correspondente da NBC, pediu a seu chefe “me põe
no time, técnico”. Rembert Browne, que tinha 27 anos e escrevia para o site de
esporte e cultura Grantland, estava olhando seu telefone num bar no Brooklin
quando sentiu “eu quero fazer alguma coisa” e comprou uma passagem aérea.
“Havia uma
massa crítica de jornalistas negros – a maioria jovens – vários ou a maioria
deles calejados na história de raça e na história de violência policial neste
país”, afirmou Jelani Cobb, do The New Yorker, um experiente e respeitado líder
do grupo, que comemorou seu 45º aniversário num bar próximo à chefatura de
policia de Ferguson.
O que
encontraram chocou muitos deles: sentindo-se abandonados, cidadãos cuja ira por
vezes mirava a imprensa e os policiais se preparavam para uma guerra.
“Ver
policiais em veículos blindados com equipamento anti-rebelião e armas
semiautomáticas, num bairro residencial nos Estados Unidos – e vê-los olhando
para pessoas negras não como cidadãos e contribuintes, mas quase como
combatentes inimigos, foi surreal”, disse Errin Haines, então repórter da
Fusion e atualmente editor especial para The 19th, numa entrevista telefônica.
Em 18 de
Agosto, após nove noites de agitação, a policia de Ferguson impôs que os
manifestantes simplesmente não podiam reunir-se em lugar algum. Então a
repórter Yamiche Alcindor disse que passou a andar sem parar, entrevistando
manifestantes cansados, que faziam a mesma coisa.
“Andar em
círculos e só mais tarde tomar consciência de que a regra era simplesmente
inconstitucional mudou minha maneira de pensar sobre o oficio de repórter – me
fez refletir que eu deveria questionar tudo, inclusive as regras de nosso
trabalho de reportagem”, disse-me em entrevista Alcindor, que na época era
repórter do Times e agora é setorista do programa PBS NewsHour na Casa Branca.
A polícia
não fazia muita distinção entre o pessoal da mídia e as pessoas que os
jornalistas estavam cobrindo. “Não havia a percepção de que eu era diferente de
um manifestante. Levei empurrões, a polícia apontou armas contra mim e contra
outras pessoas”, lembrou Joel Anderson, então repórter do BuzzFeed News em
Ferguson e atualmente redator e apresentador de um podcast da Slate.
Alguns
jornalistas, como Adam Serwer, da MSNBC, hoje na The Atlantic, já chegaram
céticos sobre o lado policial da história. Outros, como Melvin, haviam
trabalhado em noticiário local recorrendo a fontes policiais.
“Quanto mais
tempo você ficava lá, quanto mais gente você entrevistava e mais informação
surgia, mais claro ficava que a narrativa oficial era um monte de merda”, disse
Melvin em entrevista telefônica.
O veio
central para os repórteres, produtores, ativistas e uma vasta audiência
nacional era o Twitter, que já havia começado a sutilmente modificar a dinâmica
do poder nas notícias. A plataforma conduzia a cobertura. Quando John Eligon,
do The Times, publicou um perfil bastante simpático de Michael Brown, que o
descrevia como “nenhum anjinho”, causou indignação no Twitter, como símbolo de um
estilo jornalístico que parecia muito inclinado a explicar a violência
policial.
“Eles tinham
razão" sobre a frase, lembrou Elington na semana passada. O Twitter fazia
você se sentir mais responsável para com uma audiência mais ampla e uma
audiência mais diversa.”
A plataforma
proporcionava também aos repórteres mais jovens “liberdade para estabelecer
seus próprios suportes, de um jeito que nós não conseguíamos sem que alguém nos
desse as chaves”, disse Trymaine Lee, então com 35 anos e como repórter da
MSNBC.
“Anteriormente
você era um joguete da Redação,” disse Lee, hoje correspondente da MSNBC. Mas
no Twitter, os jovens jornalistas recebiam “reforço positivo, milhares e
milhares de pessoas dizendo ‘Sim, nós gostamos disso.’”
Nova
Pressão sobre as Redações
Algumas das
lições aprendidas em Ferguson – sobre raça e sobre a experiência particular de
repórteres negros, entre outras – se refletiram na desafiadora era seguinte: a
chegada de Trump, cuja linguagem e táticas intolerantes destruíram normas.
Repórteres negros uniram-se a outros jornalistas para pressionar, nas Redações
e no Twitter, por linguagem mais direta – e menos deferência – na cobertura do
presidente.
Esse padrão
persistitiu na semana passada, quando profissionais do Times começaram uma
extraordinária campanha para condenar publicamente o artigo escrito pelo
senador Cotton. Membros de um grupo interno chamado Black@NYT organizaram a iniciativa num novo canal Slack
e chegaram a um manifesto cuidadosamente redigido. O texto diria que o artigo
de Cotton “colocava em perigo” os profissionais negros, palavras escolhidas
para “focar no trabalho” e “evitar que fosse interpretado como sendo
hiperpartidário”, disse um deles. Na quarta-feira à noite, por volta das 07:30,
horas depois que o artigo foi postado, funcionários do Times começaram a tuitar
uma tela com o texto de Cotton, a maioria com alguma versão da sentença: “A
publicação disto põe em perigo os funcionarios Black@nytimes.” A associação de
jornalistas (NewsGuild) de Nova York mais tarde orientou os profissionais de
que essa formulação era uma fala legalmente protegida porque focalizava a
segurança no local de trabalho. “Não era só uma opinião, era violento –
convocava para uma ação que poderia ferir pessoas” afirmou um ativista sindical
sobre o artigo de Cotton.
Funcionários
do Times enviaram ao publisher uma carta, à qual um repórter me deu acesso,
dizendo que “a mensagem [de Cotton] solapa o trabalho que nós fazemos, na
Redação e em opinião e é uma afronta aos nossos padrões de reportagem precisa e
ética no interesse do público.” Um porta-voz da associação NewsGuild declarou
que mais de mil funcionários do Times assinaram a carta, mas que seus nomes não
seriam tornados públicos, nem divulgados internamente.
O protesto
deu resultado: o jornal entrou em crise interna e o publisher, A.G.Sulzberger,
resolveu que não podia continuar com Bennet como editor da seção de Opinião,
que havia tropeçado repetidas vezes, enfurecendo a Redação.
Bennet
reconheceu que não havia lido o artigo antes da publicação, o que foi visto
como uma confissão condenatória por pessoas de todos os níveis do Times. Ele
afirmou numa reunião virtual na sexta-feira com cerca de quatro mil
profissionais do Times que, “com relação a idéias e até idéias perigosas, a
coisa certa a fazer é expô-las na nossa plataforma ao escrutínio e ao debate
públicos e esse é o melhor caminho, de forma que até idéias perigosas possam
ser descartadas.” Mas acrescentou que agora estava se perguntando “Isso estará
certo?” (Bennet não aceitou ampliar a discussão dessa situação comigo.)
Na mesma
reunião, executivos do Times agradeceram aos profissionais por sua indignação
pública e no mesmo dia, mais tarde, publicaram uma nota editorial acima do
artigo de Cotton, afirmando que ele continha alegações que “não foram
confirmadas”, seu tom era “desnecessariamente áspero” e que ele não deveria ter
sido publicado.
E enquanto
os que se irritaram com o artigo de Cotton dominaram as conversas no Twitter e
no Slack e ganharam o dia, alguns profissionais discordaram da decisão,
privadamente e em público.
“Um jornal
forte e uma democracia forte não se intimida com muitas vozes. E isto tinha
claro valor de notícia,” escreveu no Twitter Michael Powell, repórter de longa
data e colunista de esportes do The Times. Além disso, considerou a nota
editorial “um embaraçoso recuo de princípio.”
As lutas no
The Times são especialmente intensas porque Sulzberger está agora avaliando
candidatos para substituir o editor executivo, Dean Baquet, em 2022, quando ele
completará 66 anos. Os candidatos representam diferentes visões do jornal e
Bennet havia personificado um tipo particular da política ecumênica do
establishment. Mas a debacle de Cotton havia claramente posto em risco o futuro
de Bennet. Quando o respeitado editor do Sunday Business, Nick Summers, disse
numa reunião do Google Hangout na última quinta-feira que não trabalharia sob
Bennet, ouviu a concordância dos colegas.
Por quanto
tempo Sulzberger e Baquet suportarão a pressão pública de seus profissionais
não está claro. Numa fase anterior de turbulência social, A.M.Rosenthal, que
dirigiu a Redação entre 1969 e 1986, ficava de olho vivo e mão pesada sobre os
repórteres que ele achava que tinham excessiva inclinação para a esquerda. As
palavras “Ele manteve o jornal na linha” estão inscritas em seu túmulo.
Minutos
depois que Sulzberger disse aos funcionários, em e-mail, que Bennet se havia
demitido, ele me recomendou que não interpretasse a medida como uma mudança
filosófica. Rosenthal, observou, havia
liderado uma Redação muito menos diversa e dedicada a cobrir Nova York para os
habitantes de Nova York.
“Neste caso
nós fizemos besteira e, se tivéssemos nos escondido por trás de ‘Queremos manter
o jornal na linha’ para não reconhecer isso, teríamos ficado mais expostos,”
declarou Sulzberger.
Em outra
entrevista na sexta-feira ele me disse: “Não estamos recuando dos princípios de
independência e objetividade. Não pretendemos ser objetivos sobre questões como
direitos humanos e racismo.”
Mas a
mudança nos principais veículos americanos – impelida por um jornalismo que é
mais pessoal e por repórteres mais empenhados em escrever o que eles consideram
verdade, sem se preocupar em desagradar os conservadores – agora parece
irreversível. Esse processo é impulsionado em partes iguais por política,
cultura e pelo modelo de negócio do jornalismo, apoiando-se cada vez mais em
leitores apaixonados dispostos a pagar por conteúdo e menos e menos em anunciantes
assustadiços.
Essa mudança
vai chegar muito tarde para a carreira de Lowery no The Washington Post. Depois
da cobertura em Ferguson ele propôs e foi um dos principais repórteres num
projeto de construção do primeiro banco de dados nacional sobre tiroteios
executados por policiais e registro das lições daí extraídas. Esse trabalho
rendeu ao The Post um Premio Pulitzer em 2016. Aos olhos de pessoas de dentro e
de fora ele parecia o protótipo do repórter precoce, claramente ambicioso, um
pouco arrogante e muito talentoso (apesar dessa imagem geralmente corresponder
a um homem branco), que subiu rapidamente na carreira em jornais americanos.
Mas Baron
tem sido mais sensível que outros chefes de Redação a repórteres que forçam os
limites no Twitter e na televisão, como narrou Max Tani no Daily Beast, no
início deste ano. (No New York Times, a politica sobre mídia social é
geralmente aplicada por meio de um e-mail passivo-agressivo de um editor e
raramente ocorre alguma outra medida na sequência.) Lowery contou que, quando
deu uma resposta firme a uma autoridade Republicana que havia criticado no
Twitter sua cobertura em Ferguson, levou um sermão de Baron.
Em 2019 o
editor executivo havia reunido exemplos de conduta por ele considerada
imprópria de parte de Lowery, entre eles um tuite que ridicularizava os
participantes de uma festa de lançamento de livro em Washington, chamando-os de
“aristocratas decadentes”; e outro tuite criticando uma reportagem do New York
Times sobre o movimento Tea Party.
E depois de
uma tensa reunião em Setembro último, Baron entregou a Lowery um memorando
escrito na linguagem desajeitada e condescendente de recursos humanos:
Lowery
estava “deixando de desempenhar suas funções de trabalho por atuar nas redes
sociais de maneira que viola a política do The Washington Post e prejudica
nossa integridade jornalística,” dizia o memorando.
“É preciso
que cesse imediatamente o uso impróprio das redes sociais, acima descrito. Caso
contrário tomaremos medidas disciplinares adicionais, incluindo até o fim de
seu emprego.”
Lowery
respondeu com outro memorando, defendendo-se ponto por ponto, mostrando erros
específicos e argumentando que, em um dos casos, ele estava participando de um
“debate sobre um tópico que eu cubro diretamente – raça e racismo nos Estados
Unidos.”
"Gerações
de jornalistas negros, inclusive aqui no The Washington Post, serviram de
consciência não só de suas publicações, mas de toda a nossa indústria,” disse
Lowery no memorando a Baron, ao qual também tive acesso. “Muitas vezes esses
jornalistas fizeram isso divulgando criticas publicas tanto sobre seus
concorrentes quanto sobre seus próprios empregadores. As empresas noticiosas
frequentemente reagem positivamente a tal pressão interna e externa.”
Funcionários
do Washington Post contaram que, ao confronto entre o mais famoso editor de
jornais dos Estados Unidos – Baron é retratado como herói por Liev Schreiber no
filme “Spotlight” – e seu protegido, seguiu-se uma série de esforços do editor
nacional Steven Ginsberg e outros, para mediar o conflito. Baron, por meio de
uma porta-voz, negou-se a comentar esse episódio ou seus temas mais amplos.
“Como editor, seria inapropriado ele falar sobre um funcionário individual,”
disse a porta-voz Kris Coratti.
Mas seis
meses mais tarde Lowery saiu do The Post para trabalhar num projeto do programa
“60 Minutes” sobre a nova plataforma de streaming Quibi. Foi, disse ele, uma
grande oportunidade. Mas “você teria de
estar fora da realidade para achar que o editor executivo do The Washington
Post me dar uma bronca em sua sala e me convidar para procurar emprego em outro
lugar não contribuíram para que eu procurasse emprego em outro lugar.”
Mas ele ainda tem o Twitter. Na
quarta-feira ele tuitou que havia cancelado sua assinatura do The Times e
exigia a demissão de Bennet. No dia seguinte publicou um furo importante: a
família de George Floyd e o reverendo Al Sharpton iriam promover uma marcha
nacional sobre Washington para marcar o aniversário da marcha dos direitos
civis de 1963.
“O
jornalismo americano visto-de-lugar-nenhum, obcecado pela ‘objetividade’, com
ambos os lados, é uma experiência que não deu certo,” escreveu ele no Twitter,
a propósito do desastre no Times. “Precisamos reconstruir nossa indústria de
forma a que ela atue a partir de um lugar de claridade moral.”
Esse argumento está ganhando força
nas principais Redações dos Estados Unidos. No The Times, profissionais estão
pressionando por mudanças para além da seção de Opinião. No Post, um comitê que
reporta a Ginsberg recentemente divulgou uma análise das atitudes dos
funcionários com relação à política sobre redes sociais. E no mesmo The Post,
na tensa reunião geral realizada na sexta-feira, Baron se desculpou porque, em
um recente e-mail, deixou de abordar “o fardo particular e severo suportado
pelos funcionários negros, muitos deles que também cobriam a pauta” dos
protestos, segundo anotações de um dos participantes da reunião. O sindicato
dos funcionários do Post então enviou-lhes um e-mail criticando o
pronunciamento de Baron. “O que mais chama a atenção é que as quatro vozes que
a empresa resolveu destacar neste momento pertenciam exclusivamente a brancos.
Não pode haver exemplo mais marcante da ausência de diversidade no grupo gestor
do The Post.”
Talvez mais expressivo seja que
repórteres do The Post com quem conversei tenham declarado que gostariam que
Lowery ainda estivesse lá, mandando noticias de Minneapolis para o jornal.
“Quando uma organização perde um
jornalista tão talentoso e tão comprometido com a verdade como Wesley Lowery,
seus líderes precisam se perguntar por que,” disse Felicia Sonmez, uma repórter
de política nacional que entrou em choque com Baron sobre um outro tuíte.
“Precisamos de mais repórteres como ele, não menos.”