domingo, 1 de dezembro de 2019

Empresa, Comunidade e Opinião Pública: Ágoracracia

Empresa, Comunidade e Opinião Pública: Ágoracracia: Está difícil ler jornal – impresso ou eletrônico. (E olhe que passei a vida a lê-los, fazê-los, anunciar neles, curtir o cheiro deles). ...

Ágoracracia



Está difícil ler jornal – impresso ou eletrônico. (E olhe que passei a vida a lê-los, fazê-los, anunciar neles, curtir o cheiro deles). Difícil não só pelo conteúdo cada vez mais deprimente – brontossauros que lembram o AI-5, que querem isentar da justiça militares e policiais, picaretas que tentam embair ignorantes sob mantos religiosos e pseudo-ideológicos, terraplanistas, oportunistas de todo tipo etc. – mas também por análises que me parecem ignorar a verdadeira mola propulsora da inquietude latino-americana atual.

Muitos atribuem as atuais manifestações de protesto em vários países a causas racionais – ausência de representatividade política, custo de vida, salários baixos etc. – como se os imbecís que batem panelas em apartamentos não soubessem que tudo isso é verdade desde sempre.

Na verdade, o único fator que mudou na equação foi a comunicação. Ao contrário do passado, quando tinham de se encontrar pessoalmente em cantos clandestinos, ou enviar mensagens cifradas por portadores confiáveis, hoje as pessoas se articulam instantânea, pública e universalmente pelas redes – da mesma forma como as torcidas uniformizadas combinam brigas pela cidade – e saem pelas ruas sem líderes nem mensagens, meio ao léu.

E assim acabamos em brexit, populismos fascistoides, eleições de tipos que mal sabem se expressar, juristas que dão mais entrevistas que sentenças, influenciadores e famosos (segundo eles próprios) que querem virar líderes políticos, hipócritas que dizem não acreditar que o clima está mudando – toda essa gente glorificada por inocentes úteis ansiosos por um segundo de fama no facebook ou coisa parecida. Desde, é claro, que postem lá algum palavrório ultrajante.

Por isso está cada vez mais difícil ler jornais. Eles mostram a marcha da democracia para a ágoracracia virtual. E já se conhece o trágico atoleiro onde dá esse tipo de coisa.