segunda-feira, 5 de julho de 2021

Sustentabilidade em moda. Ganhou até nome novo: ESG

 Quase um quarto de século atrás, John Elkington, um dos mais destacados pioneiros mundiais da sustentabilidade empresarial, publicou  Cannibals with Forks, (com edição em português sob o título “Canibais com Garfo e Faca”), em que criou o conceito da triple bottom line (tripla última linha do balanço),  e no qual demonstrava que o sucesso empresarial no futuro dependeria de sua capacidade de satisfazer três quesitos fundamentais: prosperidade financeira, qualidade ambiental e justiça social.

Elkington anunciou sua tese em 1997 e, desde então, a partir de um grupo de companhias clarividentes que cedo procuraram incorporar tais princípios a sua estratégia de negócios, o mundo tem testemunhado a contínua evolução desse conceito, a ponto de diversas empresas já o terem adotado – ou estarem a caminho disso – pressionadas não só por consumidores e pela opinião pública, mas também por investidores do mercado de capitais.

Agora adotando a sigla de moda ESG (Environment, Social and Governance) – que não é mais que a inicialização dos mesmos princípios enunciados por Elkington ainda no século passado – empresas em todo o mundo procuram se adequar às crescentes exigências institucionais da sociedade e buscam profissionais que possam cuidar dessa questão.

Reportagem publicada no último dia 4 de Julho pela “Folha de S.Paulo” mostra algumas das dificuldades encontradas para localizar essas pessoas, principalmente porque não se trata de uma disciplina com fronteiras claramente definidas, como as demais do organograma empresarial tradicional – finanças, jurídico, manufatura, recursos humanos, marketing etc.

Sustentabilidade é um valor, uma atitude, uma postura empresarial que precisa necessariamente perpassar todas as áreas, constituindo, portanto, mais uma consultoria qualificada, “in-house”, apta, a pedido ou por iniciativa própria, a auxiliar na solução de problemas e também – principalmente – para ajudar a evitar que eles aconteçam.

Não pode ser um departamento estanque, porque a sustentabilidade não existe sozinha. Ela se traduz, isso sim, nos atos e comportamentos de todos os setores da empresa. Além disso, suas metas não são facilmente “metrificáveis” ou “numerificáveis”, exceto por meio de pesquisas qualitativas e/ou quantitativas, que detectem e avaliem as percepções que cada público-alvo tem da empresa.

Além disso, a adoção da sustentabilidade por uma empresa não pode ocorrer de baixo para cima. Ao contrário, precisa necessariamente ser uma postura adotada corporativamente – e pessoalmente praticada no dia-a-dia e exigida de todos os funcionários – pelo principal executivo, por todos os diretores, todos os gerentes, superintendentes e demais gestores. O lema a ser internalizado tem de ser, na frase consagrada, “Fazer a coisa certa, todos os dias, o dia inteiro”. Caso contrário, a sustentabilidade almejada definitivamente não será concretizada pela empresa.

Outra complexidade da adoção do valor de sustentabilidade, para a estrutura empresarial tradicional, consiste em sua ampla abrangência de públicos-alvos. O “produto-fim” da sustentabilidade, além da compliance com a legislação, é a satisfação institucional de seus funcionários, dos fornecedores, clientes, consumidores finais, agentes financeiros e acionistas, ambientalistas, acadêmicos, autoridades governamentais, das comunidades em que atuam, da imprensa – enfim, de todas as “partes interessadas” (ou stakeholders) da empresa.

O que não significa que ela deva curvar-se, indefesa, a caprichos ou reivindicações com os quais não concorde, de parte de qualquer desses segmentos. O departamento jurídico continuará a ir à justiça em defesa de suas causas, o RH continuará a discutir suas posições com os trabalhadores e os sindicatos, os setores financeiro, de produção e vendas continuarão a buscar a lucratividade da empresa – enfim, todas as áreas prosseguirão em seus esforços em favor do interesse da empresa, porém respeitando os princípios da compliance, da integridade, dos direitos humanos, do respeito ao meio ambiente e sua preservação, do apoio ao aprimoramento da qualidade de vida das comunidades em que a companhia atua.   

Mas uma empresa sustentável, que adote como Norte o “triple bottom-line”, fará tudo isso sabendo que, além de atingir e, se possível, superar suas metas materiais imediatas, deverá também assegurar, por seu comportamento, a aceitação e aprovação das “partes interessadas” em sua reputação institucional – das quais depende, ao fim e ao cabo, sua perenidade.

Um comentário:

  1. Muito interessante e muito bem lembrado. E relevante para a minoria empresarial que enxerga o ambiente, a sociedade e a cultura a sua volta. Mas o retorno do conceito em roupa nova revela o quanto a maior parte é cega, surda, muda e anosmática. O que se pode realmente afirmar sobre a grande maioria das empresas é que, seja na versão triple bottom line, seja como ESG, o melhor que se pode esperar é um link no site e incerta criação do departamento de sustentabilidade, ao lado do café, na curva que leva ao almoxarifado.

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